Professor William é meu amigo, meu professor e havia publicado este texto anos antes, mas acredito ser pertinente pelo período....
William Carvalho*
Com
o período chuvoso no Brasil, um raio caiu no Buritinga. Raios quando caem
provocam incêndio, matam e causam grandes estragos.
Para
uma análise estrutural do Caso Arruda devem ser deixadas de lado as paixões tão
usuais na análise de fenômenos políticos no presente.
Primeiramente
tem que se considerar o contexto político do Distrito Federal. Com a nova
Constituição, Brasília passou a ter autonomia política, uma questão que até
hoje deixa dúvidas sobre tal decisão, pois Brasília não possui autonomia
financeira para gerir sua administração, dependendo da União para a
suplementação de recursos. Alguns defendem que o Distrito Federal é uma imensa
prefeitura, cujo prefeito deveria ser nomeado pelo Governo Federal. Eis o
primeiro ponto polêmico.
Com
a autonomia política, Brasília passou a ter 3 senadores, 9 deputados e 24
deputados, ditos distritais.
Brasília
possui também um eleitorado sui generis:
de um lado concentra um dos eleitorados mais politizados e informados do país, em
boa parte, incrustados nos poderes da República e conhecedores dos bastidores
do Poder, mas tem como contraponto outra parcela do eleitorado (maioria) de
pessoas de pouco instrução, pouco informadas, consideradas como se vivessem
numa região de fronteira dos grotões, ou seja, massa de manobra para todo tipo
de manipulação.
Brasília
deu um mandato a um senador que foi o único até hoje cassado pelos seus pares:
o senador Luis Estevão.
Deu
também mandatos para dois senadores – José Roberto Arruda
e Joaquim Roriz – que renunciaram para não serem cassados. Não se deve esquecer
que o Ir. Arruda é reincidente.
O
raio que atingiu o Buritinga deixa um rastro de conseqüências políticas que não
podem ser ignoradas. Devem ser evitadas as posições estremas: i) uma visão ultra
moralista que critica qualquer deslize dos políticos, por mínimo que sejam, e
ii) uma posição de tolerância absoluta para com os pecados mortais dos
políticos.
O
governador Arruda, nosso Irmão, teve em Durval Barbosa o seu algoz letal. Foi
pego com a boca na botija e em política, pode-se quebrar centenas de regras sem
maiores consequências, pelo menos na nossa cultura desse limiar do século XXI,
mas, por outro lado, existem meia dúzias de regras que quando quebradas geram consequências
mortais.
O
primeiro ponto de análise sobre o panetonegate deve ser o dos profissionais da
política. Assim, como está se comportando a cúpula do DEM? Este partido estava
se preparando arduamente para ingressar num projeto de modernização para buscar
votos nos grandes centros urbanos e deixar de ser um partido dos grotões do
interior. O DEM se prepara para cassar Arruda para tentar sobreviver e não ser
colocado no rol dos partidos nanicos.
Se
o mensalão federal, de triste memória, tivesse um Durval Barbosa que gravasse
em vídeo suas falcatruas, não seria tão facilmente esquecido e geraria cabeças
decepadas nos mais diversos níveis. Durval Barbosa é o novo fenômeno político
da atualidade neste caso sintomático, mais uma vez o mundo se queda bestificado
perante o Brasil, pois mostra as entranhas mais íntimas de nosso malfadado
sistema político. O único vídeo gravado de falcatruas do mensalão do governo
federal do PT foi o de Waldomiro Diniz, réu confesso, filmado e gravado
achacando um “bingueiro” que, pelo estágio institucional da máquina judiciária
no Brasil continua livre e solto. Em países mais desenvolvidos política e
judicialmente, ele já estaria atrás das grades a muito tempo. Era, pois, o
único vídeo, perdido no meio de miríades de alegações, mas todas sem o vídeo,
que é mortífero.
Os
políticos profissionais do DEM se preparam para decepar a cabeça de Arruda por
uma questão de sobrevivência e nesse caso são homens profissionais da política,
não movidos só por notícias da mídia e por ingenuidades inerentes aos leigos da
política. Assim Arruda já foi julgado e
condenado pelo seus pares.
Outro
ponto de análise deve ser a imprensa. A grande imprensa tem sido incansável em
denunciar o panetonegate. O mesmo não acontece com a mídia de Brasília – na sua
quase total maioria, dominados por Arruda e Paulo Otávio, como se fosse uma
pequena cidade do interior – que, se dependesse dela o caso estaria
“controlado”.
Não
se discute se Arruda estava fazendo um governo de realizações. Claro que
estava, pois na medida em que contou com uma chapa puro sangue, mais a
competência gerencial de seus quadros, Brasília esta prenhe de novas obras,
visando a Copa e as Olimpíadas e se preparava para completar suas 50
primaveras. Contudo, isso, per se, não justifica o esquecimento dos graves
fatos apontados nas gravações.
Mais
um ponto de análise: a opinião pública. Sabe-se que a grande imprensa pode
insuflar a opinião pública, mas ela só pode operar baseada em fatos reais que
possam gerar apelos emocionais. Boa parte da moderna opinião pública do
Distrito Federal e do Brasil está enojada com os acontecimentos divulgados nos
últimos tempos. Se fosse num país mais desenvolvido o caso já estaria encerrado
a muito tempo, mas no Brasil as coisas acontecem com mais vagareza. O quadro,
contudo, deixa margens a especulação: como Arruda presidiria uma sessão solene
de abertura de jogos numa Copa Mundial ou nas Olimpíadas com o estádio cheio
com convidados estrangeiros e nacionais? Será que conseguiria abafar as
estrondosas vaias?
Mais
um ponto de análise: o jurídico. Pela estágio institucional-cultural da
burocracia judiciária no país – que até hoje nunca condenou e prendeu um
político por corrupção nos termos aqui analisados – Arruda só seria condenado
se no momento do julgamento houvesse uma mobilização grande da opinião pública,
caso contrário o caso, com bons advogados, seria lançado para as calendas
gregas para posterior esquecimento ou teria uma condenação leve. Eis aí também
um fator que deve ser discutido no atual estágio brasileiro: o nível de nossa
máquina judiciária, sua lentidão, seu período de férias que segundo o editorial
do jornal Estado de São Paulo do dia 9/12/2009 beira a metade do ano, etc.
Pelo
exposto, como fica a Maçonaria em relação ao caso Arruda?
Tudo
vai depender do estágio institucional-cultural da Maçonaria Brasileira. Se a
Maçonaria estiver olhando pelo retrovisor deverá deixar o caso prosseguir para
posterior esquecimento ou esperar que o tempo dê a solução para o momentoso
caso.
Se,
contudo, estiver com os olhos voltados para o futuro, procurando sair das
palavras de seus manifestos anticorrupção e iniciar um processo de passar a
limpo o Brasil, neste limiar do século XXI, deverá arcar com o ônus de influir
nos destinos do país e do Distrito Federal, expelindo Arruda de suas
fileiras.
A
sorte está lançada. Nos próximos meses, veremos se o Brasil está maduro para
iniciar um novo período, com reformas políticas que dificultem o atual estágio
da corrupção no país. Corrupção existe em qualquer país do mundo, o que
diferencia o estágio político de cada país é se, uma vez pegos os corruptos,
eles são processados e condenados por uma justiça rápida e eficaz.
Alia jacta est...
*William Carvalho é o
Presidente da Academia Maçônica de Letras do Distrito Federal.
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